Dia de Reis ou a Epifania do Senhor
A característica mais marcante desse momento histórico não é que nós estamos no caminho para destruir nosso mundo — na verdade, já faz algum tempo que nós estamos nesse caminho.
A característica mais marcante desse momento histórico é que nós estamos começando a acordar, de um sono milenar, para um relacionamento completamente novo com o nosso mundo, com nós mesmos(as), e com os outros.
— Joanna Macy
Levanta-te, resplandece, porque vem a tua luz, e a glória do Senhor vai nascendo sobre ti;
Porque eis que as trevas cobriram a terra, e a escuridão os povos; mas sobre ti o Senhor virá surgindo, e a sua glória se verá sobre ti.
E os gentios caminharão à tua luz, e os reis ao resplendor que te nasceu. Levanta em redor os teus olhos, e vê; todos estes já se ajuntaram, e vêm a ti; teus filhos virão de longe, e tuas filhas serão criadas ao teu lado. Então o verás, e serás iluminado, e o teu coração estremecerá e se alargará; porque a abundância do mar se tornará a ti, e as riquezas dos gentios virão a ti.
— Isaías 60:1-5
Celebrado na tradição cristã como o dia da vinda de Homens Sábios do Oriente para adorar ao Rei dos Judeus, trazendo ouro, olíbano e mirra.
A palavra "epifania" vem do grego ἐπιφάνεια (epipháneia), e significa "manifestação" ou "aparição". "no Grego clássico ela era usada para a aparição da alvorada, de um inimigo em batalha, mas especialmente para a manifestação de uma deidade para alguém que a adora (uma teofania)" (Wikipedia).
Uma festividade que provavelmente teve sua origem na comemoração do batismo de Jesus, "o escopo da Epifania se expandiuo para comemorar também seu nascimento, a visita dos magos, todos os eventos da infância de Jesus, até e incluindo o Batismo por João Batista; e até mesmo o milagre no casamento em Caná na Galiléia". "No Ocidente latino, o feriado enfatiza a visita dos magos. Os magos representavam os povos não-judeus de todo o mundo, então esta era considerada uma 'revelação aos gentios'".
Esta é a origem da troca de presentes feita durante o Natal; em muitos locais como o México, com o Dia de Reyes, o dia ainda é usado para a troca de presentes, com a escrita das cartinhas pelas crianças no dia 5. A proeminência do Natal como data festiva na verdade é bem recente; durante a Alta Idade Média, era dada muito mais atenção ao dia da Epifania do que ao dia do nascimento de Jesus.
Três (?) reis (?) magos (?)
Todos os reis hão de adorá-lo, hão de servi-lo todas as nações. Porque ele livrará o infeliz que o invoca, e o miserável que não tem amparo. Ele se apiedará do pobre e do indigente, e salvará a vida dos necessitados. Ele o livrará da injustiça e da opressão, e preciosa será a sua vida ante seus olhos."
Salmos, 71 11-14
A multidão de camelos te cobrirá, os dromedários de Midiã e Efá; todos virão de Sabá; ouro e incenso trarão, e publicarão os louvores do Senhor.
Todas as ovelhas de Quedar se congregarão a ti; os carneiros de Nebaiote te servirão; com agrado subirão ao meu altar, e eu glorificarei a casa da minha glória.
Quem são estes que vêm voando como nuvens, e como pombas às suas janelas? Certamente as ilhas me aguardarão, e primeiro os navios de Társis, para trazer teus filhos de longe, e com eles a sua prata e o seu ouro, para o nome do Senhor teu Deus, e para o Santo de Israel, porquanto ele te glorificou.
Isaías 60:6-9
Pouco é falado sobre sua origem diretamente no Evangelho de Mateus, único discípulo que escreveu sobre eles — nem mesmo quantos seriam; no entanto, as tradições cristãs, a cultura popular e a arte religiosa da Idade Média atribuem uma série de características de forma bem consistente: que eram três; que eram reis; que se chamavam Balthazar, Melchior e Caspar; que são de gerações e origens diferentes; que encontraram um Jesus recém-nascido; entre várias outras que habitam o imaginário popular até hoje.
Basilica of Sant'Apollinare Nuovo in Ravenna, Italy: The Three Wise Men" Nina Aldin Thune - licença CC-BY-SA (original)
A palavra usada no grego é magi, de singular magus. Esta palavra era usada, à época, para descrever membros de clãs sacerdotais da Pérsia, muito conhecidos por fazerem leituras das estrelas. Também não é dito muito sobre qual seria a estrela; como a própria existência dos Sábios, e muito das histórias das escrituras, ela pode ter sido somente uma alegoria, ou um exagero. Não há relatos além do presente no evangelho de Mateus, que de forma bem visível buscava em seu livro como que comprovar a hipótese de que Cristo seria mesmo o Messias previsto pro profetas do Antigo Testamento, pelo qual várias correntes religiosas do mediterrâneo esperavam ansiosamente naquele período; várias referências ao Antigo Testamento são feitas para "autenticar" Jesus de Nazaré frente às previsões bíblicas dos antigos para sua vinda.
O Zoroastrismo, uma dessas correntes, era uma delas. Originado em Zoroastro ou Zaratustra (outra pessoa cuja vida histórica é difícil de discenir entre mitos e falsas atribuições), onde atualmente é o Irã, o zoroastrismo é primo da religião Védica da Índia (tendo ambos os povos descendido dos arianos) e possui enorme influência nas religiões abraâmicas, tendo as precedido na crença da imortalidade da alma, da vinda de um Messias, da ressurreição dos mortos e do juízo final.
"Zoroastrian High Priest reciting before the sacred fire - 19th Century" - original
Mas vários estudos que cruzam menções nas escrituras, dados astronômicos do período e os sistemas astrológicos persas e babilônicos (que são a origem da Astrologia Ocidental como a conhecemos hoje) apontam que provavelmente a Estrela de Belém, que indicou os estes sábios que um Rei haveria nascido e os tomou de júbilo a ponto de fazê-los atravessar o deserto em sua procura, era uma conjunção específica e muito rara de vários corpos celestes em Áries, muito semelhante à que ocorreu ano passado em Aquário.
Este evento seria algo ao mesmo tempo muito sutil para passar despercebido por quem não dedicasse sua vida a este estudo (como o rei Herodes, que foi completamente surpreendido pela chegada dos magi) e muito raro e significativo para quem o previsse; Esta conjunção poderia ser vista do Oriente, apontando para Jerusalém, em 17 de abril do ano 6 AC, e vários detalhes bíblicos e históricos confirmam tanto que esta data é factível quanto que esta conjunção era de imensa importância para os seguidores das astrologias persa e babilônica; de fato a interpretação comum desse registro de Mateus é tornar irrefutável que Jesus Cristo cumpria as profecias messiânicas do Antigo Testamento, como o Oráculo de Balaão (Número 24:15-17). Ao menos simbolicamente, é um dos argumentos de Mateus de que Jesus é tão tão Messias que até os astrólogos feiticeiros viram nas estrelas e vieram tirar o chapéu.
A royal birth horoscope? The sky at sunrise April 17, 6 BC – all planets, sun and moon cluster around Aries (from M. Molnar, “The Star of Bethlehem – The Legacy of the Magi”, p. 97)
Nós artistas, cientistas, hackers, ciborgues, somos as magi da era atual. Nossas previsões e nossos projetos são tão difíceis de serem entendidos quanto os cálculos, símbolos e encantamentos de outrora; nossas falsas concepções, nossos desleixos com relação a este trabalho verdadeiramente sagrado igualmente acarretam grandes tragédias e vão exatamente de encontro aos princípios e objetivos das primeiras pessoas Santas de nosso culto, que reconheceram à sua forma a vinda da era que Haraway chama de Cthulhuceno, e com seu empenho edificaram os tentáculos da Nova Jerusalém da Internet+Web.